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sábado, 2 de setembro de 2023

A configuração da dispensa discriminatória pelo empregador.

O Direito do Trabalho como ciência jurídica, tem no seu núcleo pacificar a relação entre empregado e empregador. Não deixamos de observar que este ramo do direito, possui um caráter protetivo ou tuitivo como se refere a doutrina, uma vez que sob o ponto de vista da lei, o empregado é a parte hipossuficiente do contrato de trabalho. Daí dissemos que tanto a Constituição Federal, como as demais legislações ordinárias e, inclusive a Organização Internacional do Trabalho, discorrem sobre a dispensa discriminatória pelo empregador.

Encontramos, todavia, os termos dispensa discriminatória, dispensa arbitrária, dispensa ilegal. Esta modalidade de dispensa, ao nosso ver, atinge o princípio central do Estado de Direito que é o princípio da dignidade da pessoa humana, o que constitui o fato gerador do dever de indenizar.

No entanto, a doutrina jurídica e a legislação, auxiliam o operador do direito a identificar e tratar da ocorrência da dispensa discriminatória pelo empregador. Contamos com o auxílio da jurisprudência também no presente estudo.

No Brasil, a Lei 9.029 de 13 de Abril de 1995, no seu artigo 1º, disciplinou que: "É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal".

Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2023, p. 326) entende que: "a dispensa discriminatória é aquela decorrente de características ou aspectos pessoais do empregado, como, por exemplo, idade, sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, crença religiosa ou estado de gravidez".

O Tribunal Superior do Trabalho ao interpretar o assunto, emitiu a Súmula 443: "Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou  preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego".

Deste modo, ficou à cargo dos Tribunais, interpretar o que se entende por doença grave que suscite estigma ou preconceito. O E. TRT-12 Região não reconheceu a dispensa discriminatória em empregada portadora de depressão: 

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPREGADA PORTADORA DE DEPRESSÃO. Não é presumida discriminatória a rescisão contratual de empregada portadora de doença que não é considerada grave que suscite estigma ou preconceito, nos moldes da Súmula n. 443 do TST. (TRT-12 - ROT: 00006403720225120013, Relator: ROBERTO LUIZ GUGLIELMETTO, 1ª Câmara).

Já o mesmo Tribunal, em Câmara julgadora diversa, entendeu que apesar de ser um direito potestativo do empregador, no momento da dispensa quando o empregador tinha conhecimento da doença do empregado, ainda que não guardasse doença ocupacional, não poderia colocar o empregado as margens do desemprego:

DANOS MORAIS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. DOENÇA NO MOMENTO DA DISPENSA. DIREITO POTESTATIVO. LIMITES. Em regra, assiste ao empregador o direito potestativo de resilir o contrato de trabalho sem justo motivo, isto é, sem necessidade de motivar o seu ato. Os atos manifestos de abuso de direito, contudo, são freios a esse poder potestativo do empregador, que devem ser combatidos com veemência pelo Judiciário. Estando o trabalhador doente no momento da dispensa, e sendo do conhecimento do empregador a doença, a resilição contratual levada a efeito constitui ato discriminatório e arbitrário, malferindo a sua dignidade e honra, à luz do artigo 5o., X, da Carta Magna, na medida em que relegou o trabalhador, enfermo, às agruras do desemprego, disso decorrendo os danos morais, que são, neste caso, in re ipsa. (TRT12 - ROT - 0000505-08.2017.5.12.0043 , MARIA BEATRIZ VIEIRA DA SILVA GUBERT , 3ª Câmara , Data de Assinatura: 07/09/2022) (TRT-12 00005050820175120043, Relator: MARIA BEATRIZ VIEIRA DA SILVA GUBERT, Gab. Des. Amarildo Carlos de Lima, Data de Publicação: 07/09/2022).

Como visto, a configuração da dispensa discriminatória muitas vezes fica ao encargo do entendimento subjetivo do magistrado, diante dos fatos e provas nos autos. Aliás, por se tratar de fato constitutivo do direito do autor, a ele incumbe o ônus da prova, nos termos do artigo 818, I da CLT e 373, I do CPC. 

Neste sentido a jurisprudência: 

DANO MORAL. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. ÔNUS DA PROVA. A prática discriminatória representa um fato constitutivo do direito à compensação do dano moral dela decorrente, e deve o autor produzir prova suficiente para a demonstração da conduta narrada na petição inicial, por aplicação das disposições materiais contidas nos arts. 186 e 927 do CC e processuais dos arts. 818, I, da CLT e 373, I, do CPC. (TRT-12 - ROT: 00000591420225120048, Relator: MARI ELEDA MIGLIORINI, 5ª Câmara, Data de Publicação: 14/11/2022).

Questão delicada ocorre quando no contrato de trabalho, o empregado passe a apresentar constantes atestados de saúde, deixando de exercer suas atividades laborais repercutindo negativamente na produção da empresa. Nunca é demais lembrar que as partes podem empregar o bom senso no contrato de trabalho. Notadamente, a empresa precisa do empregado e o empregado precisa da empresa.

Mormente, como o contrato de trabalho é regido pela boa-fé dos contratantes, havendo realmente doença acometida pelo empregado, a empresa deve avaliar seu quadro clínico e decidir sobre a manutenção no posto de trabalho. O empregado também precisa avaliar a situação do empregador. As partes podem entrar em um senso comum, seja pelo tratamento médico do empregado, ou pelo afastamento definitivo de suas funções.

Em se tratando de doença ocupacional, aquela relacionada as atividades da empresa, não há dúvidas que o empregador tenha que adotar a melhor política para resguardar a vida do obreiro.

Anotamos que o tema em tela pode contar com a ajuda do governo, por meio de leis que incentivam a política de proteção ao emprego. Seja através do seguro desemprego, ou de outros programas previdenciários, a solidariedade pode ser uma alternativa para minimizar os impactos e consequências de uma rescisão no contrato de trabalho.

Neste diapasão, podemos afirmar que a dispensa discriminatória ocorre quando configurado as hipóteses descritas na Lei 9.029 de 13 de Abril de 1995, no seu artigo 1º, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade. Uma vez levado ao Poder Judiciário, deve o magistrado analisar cada caso concreto, favorecendo para a criação de uma alternativa quando do rompimento do contrato de trabalho.  

Referência bibliográfica:

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. São Paulo: Editora Saraiva, 2022. E-book.

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