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domingo, 12 de dezembro de 2021

Contrato de trabalho, violência doméstica e direitos da mulher.

No campo do direito do trabalho, a Lei 11.340/2006, que trata de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, também repercute diante do contrato de trabalho.

Antes de adentrarmos no tema central, precisamos distinguir a suspensão do contrato de trabalho e a interrupção. A principal diferença para distinguir os efeitos do contrato de trabalho, suspensão e interrupção, é de que na interrupção o empregado é remunerado, conta-se o tempo de serviço. Já na suspensão, o empregado não recebe salário, e não conta-se o tempo de serviço. A legislação trabalhista se encarrega de definir quando é suspensão ou interrupção do contrato de trabalho.

Assim, diante da redação do parágrafo 2º, inciso II, do artigo 9º da Lei Maria da Penha, indaga-se se a previsão ali contida, é caso de suspensão ou interrupção do contrato de trabalho.

Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.

§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:

II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.

É compreensível que a mulher ofendida, pela qual encontra-se em situação de vulnerabilidade não venha a ser prejudicada também no seu contrato de trabalho, assegurando a lei a manutenção do vínculo trabalhista, quando afastada por até seis meses.

Justifica-se o afastamento da mulher do trabalho, ou porque labora no mesmo ambiente do agressor, ou ainda encontra-se incapacitada de exercer suas funções, necessitando de tratamento adequado para restabelecer sua saúde, seja física ou psíquica.

Em que pese a lei alcance os fins sociais, instituindo políticas públicas de proteção a mulher, vítimas de violência doméstica, em nada falou a lei, sobre quem deve pagar o salário neste período em que a mulher possa ficar afastada do trabalho no prazo de 6 meses. Ou seja, a lei 11.340 não menciona em nada, sobre os efeitos do afastamento ao trabalho e as obrigações trabalhistas e previdenciárias, como cômputo do tempo para férias, 13º salário e FGTS.

Sergio Pinto Martins (2021, p. 575), acrescenta que:

Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo a não ser em virtude de lei (art. 5º, II, da Constituição). É o princípio da legalidade. Se não existe previsão da lei a respeito de pagamento de salário da empregada afastada por seis meses em razão de violência doméstica, não há obrigação do empregador de pagá-lo. O empregador não teve culpa ou deu causa a qualquer ato em relação a empregada para ter que pagar salários.

O entendimento consubstanciado parece ser justo, ao nosso ver, pois não pode o empregador responder economicamente pelo fato infeliz ocorrido com sua empregada, tendo em vista as inúmeras obrigações que já possui com seu empreendimento. Como dito alhures, busca-se manter o vínculo empregatício.

Diante da lei trabalhista, o afastamento da ofendida, enquadra-se como suspensão dos efeitos do contrato de trabalho, ou ainda, uma licença não remunerada.

Mas persiste a dificuldade da mulher prover sua subsistência com alimentação, moradia, tratamento de saúde e outras necessidades, pois uma vez que não esta percebendo salário, qual alternativa encontrada?

Neste sentido, Luciano Martinez (2021, p. 675) leciona que: 

Diante desse cenário, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em setembro de 2019 (ver Notícias do STJ, de 18­9­2019), adotou uma posição integrativa digna de nota. O referido Colegiado entendeu que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deveria arcar com a subsistência da mulher que tivesse de afastar­-se do trabalho para proteger-­se de violência doméstica. Segundo o voto do relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, os traumas decorrentes da violência doméstica, por macularem a integridade física ou psicológica da vítima, haveriam de ser equiparáveis à enfermidade, o que justificaria o direito ao auxílio­doença.

A solução encontrada pelo Superior Tribunal de Justiça, encontra respaldo no artigo 226, parágrafo 8º da Constituição Federal de 1988 in verbis:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Destarte, a mulher como pessoa componente da família, sem mencionar sua função e importância no seio familiar, conta com a proteção do Estado, direito garantido constitucionalmente pelo legislador ordinário.

O direito e as leis, quando elaborados e aplicados pelo bem comum, cumprem a finalidade da justiça social, e ao mesmo tempo estar-se-á preservando pela dignidade da pessoa, neste caso das mulheres, no contexto que estão inseridas. 


Referências bibliográficas:

MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Editora Saraiva, 2020. 9788553618408. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788553618408/. Acesso em: 12 dez. 2021.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 37. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.

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