A alienação de Unidade de Produção Isolada (UPI) em empresas em recuperação judicial: (im) possibilidade da sucessão do arrematante nas obrigações trabalhistas do devedor.

Aos colegas do De Marck Advocacia

As empresas possuem uma função social que impulsionam a vida econômica na sociedade. Através das atividades empresariais, que se alcança a geração de emprego, a arrecadação de tributos, o desenvolvimento da economia, a circulação de bens e serviços na sociedade, a conquista de riquezas e por consequência o bem estar social. É de interesse do Estado de Direito que a empresa se mantenha funcionando gerando lucro e receita, e o incentivo do Estado para empresa também é importante, daí constatamos que há uma via de reciprocidade entre as instituições públicas e privadas, ou seja uma cooperação para o bem de todos.

Notadamente, não surte bons efeitos a empresa mal administrada, ou que apresente incapacidade de cumprir suas obrigações básicas, de pagar os funcionários, os fornecedores, credores, e principalmente suas obrigações perante o fisco. É possível ainda que venha enfrentar crises no exercício de suas atividades, como baixo faturamento ou outros eventos sensíveis, que fazem parte do complexo processo que é administrar uma empresa e mantê-la em funcionamento.

Foi no entanto, diante destas premissas que o legislador ordinário buscou positivar na norma, mais precisamente na Lei 11.101/2005, denominada com Lei de Falência e Recuperação Judicial um paliativo, ou ainda um incentivo, que também podemos chamar de um tratamento intensivo na saúde da empresa para reestabelecer sua saúde financeira, e voltar a gerar lucros e resultados positivos.

Sílvio de Salvo Venosa (2023, p. 319) enfatiza:

O legislador tenta por vários meios quebrar a engrenagem do efeito cascata provocado pela empresa em crise. Nesse sentido, a atual Lei de Falências e Recuperação Judicial, Lei nº 11.101/05, funda-se primordialmente na preservação da empresa, criando processos de recuperação extrajudicial e judicial como medidas de alerta no tratamento das empresas em dificuldades e permitindo, em sede de falência, a permanência do seu funcionamento.

Não há dúvidas que a promulgação da LFR foi bem aceita pelas sociedades empresariais, pois de fato, a lei uma vez aplicada surte bons resultados, e na maioria das vezes se obtém o êxito dando um fôlego para as empresas em situação difícil, proporcionando outros caminhos, ou o que chamamos ainda de alternativas para seguir o fluxo da vida financeira empresarial.

Mormente, a fim de cumprir com o enunciado do presente artigo, passamos a discorrer da Unidade de Produção Isolada (UPI), quando mencionada na Lei 11.101/2005. Paulo Penalva Santos, ao escrever o artigo "Alienação  de UPI por cisão parcial na recuperação judicial", conclui pelo conceito de UPI:

A UPI pode ser definida como parcela do estabelecimento ou parte dos estabelecimentos do devedor empresário em recuperação judicial que, mesmo destacada do todo, permanece capaz de desenvolver atividade empresária de forma independente. (Disponível em: https://www.migalhas.com.br/coluna/insolvencia-em-foco/332134/alienacao-de-upi--por-cisao-parcial-na-recuperacao-judicial).

O artigo 60 da LRF dispõe que: "Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 desta Lei".

No entanto o artigo 60-A do diploma em questão, reza que a unidade produtiva isolada, poderá abranger bens, direitos ou ativos de qualquer natureza, tangíveis ou intangíveis, isolados ou em conjunto, incluídas participações dos sócios.

Neste diapasão, dizer que a UPI é parte da empresa recuperanda que, a sua alienação não interfere no funcionamento e independência da empresa matriz, sendo esta capaz de manter suas atividades com total autonomia, ou ainda que garanta a produção independente.

Esta possibilidade garantida pela LRF, tem atraído os investidores e tem se revelado uma boa solução para as empresas recuperandas conseguirem recursos para saldarem suas obrigações. No entanto, é preciso analisar as consequências jurídicas da empresa adquirente sobre os ativos ou passivos da empresa recuperanda. Daí adentramos na (im) possibiliadade da sucessão do arrematante nas obrigações trabalhistas do devedor.

Pensando nisso o legislador no artigo 140, inciso II da LRF positivou: "o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho".

Especificamente acerca das relações trabalhistas, o parágrafo 2º do artigo 140 da LRF é bem claro: Empregados do devedor contratados pelo arrematante serão admitidos mediante novos contratos de trabalho e o arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato anterior.

A jurisprudência laboral também é neste sentido:

SUCESSÃO TRABALHISTA. AQUISIÇÃO DE UNIDADE PRODUTIVA DE EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. O parágrafo único do artigo 60 da Lei nº 11.101/2005, estabelece que nos casos que envolvem a recuperação judicial de empresas, a alienação de unidade produtiva isolada está livre de qualquer ônus, não havendo sucessão de empresa quanto às obrigações do devedor, mesmo que trabalhistas. O Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do artigo 60, parágrafo único, da Lei nº 11.101/05 (ADI nº 3934-2/DF). Não provimento ao recurso. (TRT-1 - ROT: 01013775720175010004 RJ, Relator: ROBERTO NORRIS, Data de Julgamento: 08/02/2021, Quarta Turma, Data de Publicação: 20/02/2021).

Acerca do processo de alienação da UPI, consigna-se que deve constar no plano de recuperação judicial e posteriormente ser homologada pelo juízo da recuperação judicial. Inteligência do artigo 166 da LRF, com a seguinte redação: "Se o plano de recuperação extrajudicial homologado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado, no que couber, o disposto no art. 142 desta Lei".

Logo, diante da previsão legal e do entendimento da jurisprudência, afirmamos que o adquirente da UPI criada em processo de recuperação judicial e alienada, não responde por dívidas trabalhistas em razão do contrato com a empresa recuperada. Conforme indica a Lei 11.101/2005, o arrematante deverá fazer nova contratação do empregado, deste modo não caracterizará a sucessão trabalhista.

Referências bibliográficas:

VENOSA, Sílvio de S. Direito Empresarial. São Paulo: Grupo GEN, 2020. E-book.

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